Seguradora perde batalha pela tese de agravamento intencional de risco
Fernando Porfirio
O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou a Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A (MetLife) a pagar o prêmio de R$ 1,4 milhão prevista na apólice de seguro de uma dona de casa, morta a tiros numa estrada de Embu, na Grande São Paulo.
A decisão é da 25ª Câmara de Direito Privado da corte paulista, com voto dos desembargadores Edgard Rosa, Walter Cesar Exner e Vanderci Álvares, que rejeitaram a tese de agravamento intencional de risco.
No caso, a empresa se negou a pagar o seguro aos beneficiários da vítima alegando má-fé da segurada na contratação da apólice. De acordo com a seguradora, a vítima tinha dívidas avantajadas, problemas psiquiátricos e premeditou sua morte para favorecer filhos, irmãos e uma sobrinha.
Ao decidir contra a MetLife, a turma julgadora entendeu que a má-fé não se presume, precisa ser provada; o que não foi alcançado pela seguradora. O desembargador Edgard Rosa, relator do recurso, entendeu ainda que a seguradora não pode eximir-se do dever de indenizar, alegando omissão de informações por parte da segurada, se não se acautelou e dela não exigiu exames clínicos prévios.
“Nos contratos de seguro, a boa-fé sobrepuja-se numa das principais características”, disse o relator. “Daí porque, todas as informações prestadas pelo segurado devem guardar exata correspondência com a realidade. Não é raro, nesse tipo de contratação, existir questionário sobre diversas particularidades, inclusive, do perfil do segurado, com reflexo no preço do prêmio. Tais particularidades interferem na assunção, pela seguradora, do risco que é inerente e da própria essência do contrato de seguro”, completou Edgard Rosa.
Maria Eliete Urbano contratou o seguro de vida com a MetLife em agosto de 2005. Em dezembro do mesmo ano foi encontrada morta dentro do carro, numa estrada de Embu, vítima de tiros na cabeça. A polícia afirma que foi vítima de latrocínio cometido por dois jovens, um deles com quem tinha relacionamento amoroso.
A vítima deixou um capital segurado para falecimento por causa acidental no valor de R$ 1,4 milhão, tendo como beneficiários seus três filhos, dois irmãos e uma sobrinha. Em julho de 2011, sentença do juiz Edson Luiz de Queiroz, da 3ª Vara Cível de Santo Amaro, acolheu recurso da MetLife, que sustentou a tese de suicídio premeditado.
Depois de investigar o sinistro, a MetLife alegou que Eliete fez o contrato três meses antes de sua morte para beneficiar os filhos, um irmão e uma amiga. De acordo com a seguradora, as provas indicam que o aparente latrocínio, na realidade, constituiu “suicídio assistido”, premeditado pela segurada com o fim de garantir aos beneficiários o pagamento da indenização securitária.
Inconformada com a sentença de primeiro grau, a família da vítima pediu ao TJ paulista a reforma do julgamento. Sustentou que a indenização securitária é devida, pois não houve má-fé na contratação. Refutam a ocorrência de suicídio premeditado, bem como a validade do laudo pericial, por se tratar de exame indireto, que apresentou diagnóstico psiquiátrico meramente especulativo.
Alegam ainda que seguradora não se desincumbiu do ônus de provar que a segurada, ao contratar o seguro de vida, premeditava sua própria morte a fim de favorecer os beneficiários, única hipótese que permite a exclusão da cobertura contratada. No final, afirmam que a segurada foi vítima de homicídio qualificado, praticado pelo seu namorado à época, condenado na esfera criminal.
A turma julgadora entendeu que a segurada foi vítima de um crime patrimonial, julgado em duas instâncias da Justiça, que condenou os executores. Concluiu que esta decisão espraia efeitos na esfera cível, atingindo inclusive a seguradora, que não pode pretender alterar a qualificação jurídica dada ao fato na esfera criminal.
“Não fosse isso, a tese de suicídio assistido, apresentada pela seguradora, não está provada, existindo meros indícios de que isso talvez tenha ocorrido, o que não basta para o acolhimento dos embargos”, afirmou o desembargador Edgard Rosa.
“Os indícios apontados pela Cia seguradora não são suficientes para afirmar a premeditação da segurada ao contratar o seguro, muito menos para que, em Juízo, se afirme a existência de suicídio assistido (hipótese relatada na doutrina como rara)”, completou o magistrado.
Para a turma julgadora, a definição do crime, no Juízo criminal, vincula a jurisdição cível. “Se os agentes foram condenados pelo crime de latrocínio, por acórdão emanado da Seção Criminal desta Corte, não é possível que Câmara da Seção de Direito Privado confira enquadramento jurídico diverso”, sustenta o relator do recurso no TJ paulista.
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