A terceirização e a necessidade de um marco regulatório
Anna Beatriz França*
Os protestos em diversas regiões do país contra o projeto de lei da terceirização (PL nº 4330/04) chama atenção para a seguinte pergunta: o que esta proposta tem de tão polêmica, capaz de mobilizar diversos setores da sociedade, sejam eles empresários ou empregados? E a resposta não é simples. O projeto pretende regulamentar a terceirização, fenômeno que já existe nas relações trabalhistas, causa uma enxurrada de ações judiciais e assombra o Poder Legislativo há 11 anos.
O debate no Congresso Nacional é uma forma de regrarmos o trabalho terceirizado e garantir os direitos dos empregadores e empregados. Um dos pontos mais polêmicos do texto em análise na Câmara dos Deputados é a possibilidade de terceirização em qualquer atividade das empresas privadas, públicas ou de economia mista, ou seja, as chamadas atividade-meio ou atividade-fim.
Outro aspecto bastante controverso é que o texto não garante a filiação dos terceirizados no sindicato da atividade preponderante da empresa. Isto, na visão dos sindicatos, fragilizará a organização dos trabalhadores terceirizados, que perderia sua força e influência.
Quanto às responsabilidades da empresa contratante do serviço terceirizado, o projeto prevê que ela somente responderá solidariamente com a contratada se não fiscalizar os pagamentos devidos aos contratados. Contudo, não é somente em críticas que a referida proposta está envolvida.
A regulamentação dos contratos de terceirização é positiva e trará segurança jurídica para as empresas. Isto porque a inexistência de regras claras para a terceirização gera múltiplas ações na Justiça contra as empresas e decisões que variam conforme o juiz, tornando o ambiente de negócios cada vez mais insustentável.
Os parâmetros para a contratação de mão de obra terceirizada no Brasil se transformaram em um dilema na Justiça do Trabalho, colocando as empresas num labirinto de decisões controversas, uma missão quase impossível para se adaptarem à economia moderna existente atualmente no mercado brasileiro.
A falta de regulamentação da atividade, vital para a geração de empregos, abre espaço para as mais ambíguas interpretações.
A Súmula nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), preenche a lacuna existente no atual cenário, onde temos uma ausência de normas que regulamentam a terceirização de serviços. Ela permite que a mão de obra terceirizada seja realizada apenas na atividade-meio da empresa.
Porém, como podemos definir o que pode ser considerada meio ou fim, se não há nada que regulamente tal distinção? Não há mais para onde correr, estamos diante de uma necessidade imperiosa de um marco regulatório. Se não for possível extinguir toda e qualquer dúvida quanto às terceirizações, que pelo menos as norteie de forma eficaz e transparente.
A parte central das modificações propostas no PL 4.330/04 é acabar com as distinções entre atividade-meio e atividade-fim nas contratações de empresas terceirizadas. E, considerando o texto substitutivo do deputado Arthur Maia, a empresa contratante terá responsabilidade subsidiária em relação às obrigações trabalhistas e previdenciárias.
Ou seja, ela apenas se tornará responsável direta caso deixe de fiscalizar a atuação da contratada, principalmente no que diz respeito aos recolhimentos dos direitos trabalhistas. Caso contrário, quem contrata passa a ser responsável por direitos, como o pagamento de férias ou de licença-maternidade, apenas se forem esgotados os bens da firma terceirizada. Se a empresa contratante for omissa e não fiscalizar, vale a responsabilidade solidária, que ocorre quando o trabalhador pode cobrar o pagamento de direitos trabalhistas tanto da empresa terceirizada quanto da contratante.
Assim, a contratante ficará responsável de fiscalizar mensalmente o pagamento de salários, horas-extras, décimo terceiro salário, férias, entre outros direitos. Quando houver alguma irregularidade, a empresa deverá reter o pagamento da fatura mensal proporcional às obrigações trabalhistas não pagas e notificar a contratada (em 10 dias) das razões da medida. O dinheiro ficará, segundo a proposta, em uma conta específica da contratante para isso.
Resta salientar que algumas empresas já preveem referida retenção de fatura, como forma de assegurar o cumprimento dos pleitos trabalhistas de seus terceirizados. Aqueles contra a elaboração de uma lei que discipline a terceirização acreditam que poderão ocorrer abusos de toda ordem, causando a precarização das condições de trabalho do empregados.
Todavia, precisamos, mais do que nunca, de um marco regulatório que discipline a terceirização de serviços no Brasil, principalmente neste momento em que o país vislumbra uma crise econômica.
*Anna Beatriz França é advogada associada do escritório especializado no setor de call center Terçariol, Yamazaki, Calazans e Vieira Dias e mestranda em Direito Corporativo.
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