Reforma da Previdência completa seis com legado de rigidez no acesso aos benefícios do INSS
Caio Prates, do Portal Previdência Total
No último dia 13 de novembro, a Reforma da Previdência completou seis anos. Anunciada com a promessa de garantir sustentabilidade fiscal e equilíbrio atuarial ao regime previdenciário, a mudança, uma das mais profundas no sistema de proteção social brasileiro desde a Constituição de 1988, ampliou restrições de acesso aos benefícios do INSS e reduziu os valores médios de pensões e aposentadorias. O resultado, segundo especialistas, é um “retrocesso social silencioso” que vem se aprofundando ao longo dos anos.
Entre os principais efeitos da reforma, na avaliação de advogados especialistas em Direito Previdenciário, estão a redução significativa do valor das pensões por morte, o aumento da idade mínima para a aposentadoria, o fim da aposentadoria por tempo de contribuição e o endurecimento das regras para a aposentadoria especial e por invalidez.
“A pensão por morte é um dos casos mais emblemáticos”, afirma o advogado João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin. “Antes, o dependente recebia o valor integral do benefício; hoje, recebe 50% mais 10% por dependente, até o limite de 100%. Uma viúva sem filhos pode receber apenas 60% do valor que o falecido teria direito. É uma mudança que reduziu drasticamente a renda de famílias que dependem dessa proteção social.”
Outro ponto sensível foi o fim da aposentadoria por tempo de contribuição, que até 2019 permitia a aposentadoria após 30 anos de contribuição para mulheres e 35 para homens, independentemente da idade. Com a reforma, o sistema passou a exigir idade mínima de 62 anos para mulheres e 65 para homens, além de regras de transição.
“Milhares de pessoas que já contribuíam há décadas foram obrigadas a adiar o sonho da aposentadoria”, comenta o advogado Ruslan Stuchi, sócio do escritório Stuchi Advogados. “A reforma endureceu as exigências e tornou o acesso ao benefício mais desigual, sobretudo para trabalhadores informais e de baixa renda”, complementa.
O advogado Celso Joaquim Jorgetti, sócio da Advocacia Jorgetti, considera a reforma um grande retrocesso social. “Com a aprovação da Reforma da Previdência, ficou muito mais difícil se aposentar. Foi implantada a idade mínima, prejudicando aqueles que começam a trabalhar mais cedo, o que faz com que muitos só possam se aposentar quando já não tiverem condições de trabalhar. No Brasil, historicamente, quem tem menor renda começa a trabalhar cedo e agora precisará trabalhar muitos anos a mais devido à exigência de idade mínima. Em alguns casos, o segurado terá que contribuir por até 40 anos para ter direito à aposentadoria. O aumento do tempo mínimo de contribuição para 20 anos para homens também prejudica os mais vulneráveis, que dificilmente conseguirão uma aposentadoria integral”, explica.
Cálculo da aposentadoria por invalidez
Badari afirma que a reforma trouxe distorções nas regras de cálculo da aposentadoria por invalidez e, por isso, defende a mudança. O problema, segundo ele, é que o cidadão que se aposenta por incapacidade permanente recebe valor menor do que aquele que fica afastado de forma temporária, ganhando o auxílio-doença.
Isso porque a reforma alterou o cálculo da aposentadoria por invalidez, rebatizada como aposentadoria por incapacidade permanente. O valor passou a ser de 60% da média de todas as contribuições, com acréscimo de 2% por ano que exceder 20 anos de contribuição, percentual considerado insuficiente para garantir uma renda digna.
Badari exemplifica a desigualdade: um segurado que sofre um acidente e fica incapacitado pode receber 91% do benefício, enquanto outro, em estado terminal de câncer, tem direito a apenas 60%.
“O benefício da doença grave é 31% menor do que o da doença temporária. Isso fere a isonomia e o princípio de proteção social”, afirma o advogado.
Segundo ele, essa distorção é objeto de discussão no Supremo Tribunal Federal, que analisa o Tema 1300 de repercussão geral, sobre a correção da fórmula de cálculo.
Avanços
Apesar das críticas, alguns avanços são reconhecidos. A reforma manteve inalteradas as regras da aposentadoria rural e da aposentadoria da pessoa com deficiência, previstas na Lei Complementar 142/2013. “Essas exceções demonstram uma certa sensibilidade social do legislador, ao preservar direitos de grupos vulneráveis. Mas são pontos de luz em um cenário de endurecimento das regras", observa Badari
Para Stuchi, o desafio daqui para frente é equilibrar a sustentabilidade financeira com a proteção social, sem penalizar os mais frágeis. “O sistema precisava de ajustes, mas o equilíbrio fiscal não pode ser buscado às custas da dignidade humana. A Previdência é também um mecanismo de redistribuição de renda, essencial para a economia de pequenos municípios.”
Seis anos após a reforma, o balanço é duplo: tecnicamente mais equilibrado, mas socialmente mais excludente. “A Previdência é um pacto social. E, passados seis anos, o país ainda busca reencontrar o ponto de equilíbrio entre sustentabilidade e proteção humana”, conclui Badari.
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