Trabalhadores e servidores que atuaram em atividades simultâneas podem ter direito à revisão de suas aposentadorias

 
 
Caio Prates, do Portal Previdência Total
 
Uma decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode trazer alívio financeiro para milhares de aposentados em todo o Brasil — especialmente professores, médicos, servidores públicos e demais profissionais que atuaram em mais de uma função ao mesmo tempo. A Corte reconheceu o direito de somar integralmente os salários das atividades simultâneas no cálculo da aposentadoria, o que pode representar aumentos superiores a 30% no valor do benefício.
 
Na prática, quem contribuiu tanto para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS/INSS) quanto para um Regime Próprio de Previdência (RPPS) — como servidores públicos que também trabalharam na iniciativa privada — terá reconhecido o valor total das contribuições mensais feitas em ambas as atividades. O tempo de contribuição não será contado em dobro, mas os salários, sim.
 
A advogada Simone Lopes, sócia do escritório Lopes Maldonado Advogados, explica que, até então, o INSS adotava um modelo que priorizava a chamada atividade "primária", enquanto a remuneração da atividade "secundária" era considerada de forma proporcional. “Isso, segundo os especialistas, resultava em acréscimos ínfimos ao benefício final, mesmo após anos de contribuição”, diz.
 
“Foi corrigida uma distorção histórica, que penalizava quem mais trabalhou e quem mais contribuiu para o sistema. Até então, o INSS e muitos regimes próprios vinham negando o direito de somar essas remunerações, amparados em uma interpretação limitada da Lei 8.213/91. O resultado era a frustração de milhares de segurados que, mesmo tendo contribuído para dois regimes ao mesmo tempo, recebiam aposentadorias desproporcionais ao que recolheram. A injustiça era escancarada, mas perdurou por décadas. O STJ não criou um novo direito — apenas reconheceu algo que sempre existiu, mas era ignorado por interpretações burocráticas e injustas da lei”, afirma Simone, especialista em direito previdenciário.
 
Para ela, a revisão é essencial para combater a desigualdade enfrentada por esses segurados. “Essas pessoas já enfrentaram uma vida inteira de dificuldades. São trabalhadores que atuaram por 30, 35, 40 anos, muitas vezes em jornadas dobradas, e hoje vivem com benefícios apertados, sentindo na pele o peso do custo de vida e da negligência estatal. O impacto fiscal da decisão será, inevitavelmente, usado como argumento contra ela. Mas é preciso inverter a lógica: não é o direito dos aposentados que desequilibra a Previdência, e sim a má gestão, os privilégios concentrados no topo e a desinformação que impede milhões de brasileiros de acessarem seus direitos. Corrigir injustiças não deveria ser exceção — deveria ser a regra", defende.
 
Quem pode pedir a revisão
 
A revisão vale apenas para aposentadorias concedidas antes de junho de 2019, quando entrou em vigor a Lei 13.846, que alterou o cálculo das atividades concomitantes. “Também é necessário que o primeiro pagamento do benefício tenha ocorrido há menos de dez anos — esse é o prazo limite para pedir a revisão no INSS”, explica o advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados.
 
Um exemplo clássico é o de uma professora da rede pública estadual que também lecionava em uma escola particular. Agora, ela poderá somar os salários recebidos nas duas funções para calcular a aposentadoria. Antes da decisão, esse acúmulo não era considerado, mesmo com contribuições regulares ao INSS e ao regime próprio de previdência.
 
Segundo o advogado João Badari, especialista em Direito Previdenciário, um aposentado que contribuiu por 35 anos como servidor público e 10 anos em outra função simultânea pode ver seu benefício aumentar de R$ 1.753 para R$ 2.110. “Somando as contribuições, o aumento pode superar 30% em muitos casos”, destaca.
 
Como a decisão foi tomada em sede de recurso repetitivo (Tema 1.070), ela tem eficácia vinculante — ou seja, deve ser seguida por todos os tribunais e pelo próprio INSS. Por isso, os especialistas recomendam que o pedido de revisão seja feito inicialmente por via administrativa.
 
Como solicitar a revisão
 
Ruslan Stuchi Lopes ressalta que, para solicitar a revisão, o trabalhador ou servidor precisa ter em mãos a carta de concessão da aposentadoria, o CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais) e o histórico de pagamentos. “Após reunir os documentos, o próximo passo é procurar o INSS para pedir a revisão administrativa. Caso o pedido seja negado, a recomendação é entrar com uma ação judicial com o auxílio de um advogado. Vale lembrar que o prazo para pedir a revisão é de até dez anos após o primeiro pagamento do benefício”, explica.
 
Os especialistas alertam ainda que o aposentado deve comprovar que atuou em mais de uma atividade no mesmo período e que não contribuiu sobre o teto previdenciário em nenhuma delas individualmente.


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