Trabalhadora dispensada após afastamento por violência doméstica deve ser indenizada
Uma trabalhadora deve ser indenizada após ter sido dispensada menos de um mês após retornar do afastamento motivado por medida protetiva da Lei Maria da Penha. A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) manteve a sentença que condenou a empregadora ao pagamento de indenização por danos morais e de indenização substitutiva relativa ao período de estabilidade previsto em lei. Para o colegiado, a dispensa teve caráter discriminatório e configurou revitimização.
A trabalhadora contou que, após ser agredida pelo ex-marido, obteve na Justiça uma medida protetiva e precisou se afastar do trabalho. Ao retornar, mesmo apresentando documentos médicos e judiciais que comprovavam o motivo do afastamento, foi surpreendida com a dispensa sem justa causa. Na ação, pediu reintegração ao emprego ou indenização substitutiva, além de indenização por danos morais, alegando falta de acolhimento diante da situação de violência e que a dispensa foi motivada por preconceito.
Em sua defesa, a empregadora sustentou que a demissão foi um ato legítimo, com base no seu direito potestativo de rescindir o contrato de trabalho. Alegou, ainda, não ter sido formalmente informada sobre a medida protetiva. Por fim, disse não ter praticado qualquer ato de discriminação ou constrangimento.
Na sentença, o juiz titular da Vara do Trabalho de Linhares, Luís Eduardo Soares Fontenelle, entendeu que a demissão, logo após o retorno da empregada, sem medidas alternativas ou acolhimento, demonstrou ato discriminatório. Para ele, a dispensa foi motivada pelo “desconforto da empregadora com os custos e implicações da situação vivida pela empregada”, o que configuraria punição por ter buscado proteção legal.
O juiz também destacou que a Lei Maria da Penha (art. 9º, §2º, II) garante a manutenção do vínculo empregatício por até seis meses, quando necessário o afastamento.
Aplicação do protocolo com perspectiva de gênero
No julgamento do recurso, o relator, desembargador Cláudio Armando Couce de Menezes, afirmou que a dispensa logo após o afastamento por violência doméstica violou princípios constitucionais e tratados nacionais e internacionais de proteção às mulheres.
Segundo ele, essa situação representa um “custo econômico da violência de gênero”, ao afetar a permanência da vítima no trabalho. O relator destacou que, diante da existência de indícios de conduta discriminatória, caberia à empregadora comprovar que a dispensa não teve relação com a situação vivida pela trabalhadora, o que não ocorreu no processo.
Para justificar a inversão do ônus da prova e reforçar a análise com sensibilidade ao contexto, Couce de Menezes citou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, instituído pelo CNJ (Portaria n. 27/2021). O documento orienta os juízes a levarem em consideração as desigualdades estruturais que afetam mulheres em situação de violência. “O simples fato de haver indícios da prática discriminatória já atrai a inversão do ônus da prova”, registrou o acórdão.
O desembargador concluiu que “a dispensa discriminatória é um ato ilícito da mais grave monta, por violar princípios basilares como a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho”, ressaltando que o Judiciário tem o dever de coibir práticas que reduzam a cidadania das mulheres no ambiente laboral. Com informações do TRT-ES
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