Empresas e trabalhadores perdem com aprovação da terceirização

Ricardo Pereira de Freitas Guimarães*

A interminável discussão sobre a regulamentação da terceirização nas relações trabalhistas ganhará novos capítulos com a discussão no Senado Federal. O projeto de lei 4.330/2004, aprovado pela Câmara dos Deputados no último dia 8, se não sofrer nenhuma alteração significativa pode tornar as relações e o mercado de trabalho ainda pior. A aprovação da proposta nos moldes atuais vai piorar a situação para trabalhadores e patrões.

Tudo indica que a presidente deverá vetar a possibilidade da terceirização de qualquer atividade empresarial. Porém, é melhor aguardar os debates e aprovações finais no Congresso.

A defesa dos empregadores pela nova proposta indica que eles foram atraídos pelo canto da sereia. Contudo, estão absolutamente equivocados. Dois pontos do projeto atraem a crença dos empregadores de que o projeto lhes favorece: o poder terceirizar qualquer atividade e a impossibilidade de vínculo de emprego entre os empregados do prestador e o tomador.

O primeiro ponto, se observado com calma, é atrativo apenas na questão financeira. Ou seja, para uma inicial economia da empresa na contratação. Porém, se ela contratar empresas que cobram muito barato e, portanto, não remuneram corretamente seus empregados, esses tomadores, na forma do projeto aprovado, continuam a ter responsabilidade subsidiária. E pior: caso esse terceirizado subcontrate outra empresa, o que é possível na forma do projeto, certamente se a prestação de serviços continuar sendo em favor do tomador desse subcontratado, a responsabilidade irá ser declarada pela Justiça do Trabalho.

Vale observar ainda que com essas sub das sub das subcontratações, cada vez mais se afasta o tomador de serviços e o contratante, inviabilizando, assim, que o próprio tomador controle se verbas e direitos trabalhistas estão sendo pagos corretamente. Em outras palavras, adia-se a dívida do tomador, mas não resolve o problema.

Já com relação à impossibilidade da declaração da relação de emprego, vale recordar que outro milagre como esse foi vendido aos empregadores quando se inseriu na CLTm (Consolidação das Leis Trabalhistas) a mesma impossibilidade de reconhecimento da relação de emprego entre cooperados e a empresa que os contratava. Quase a totalidade desses empregados que ingressaram com a ação buscando a relação de emprego, mesmo sendo cooperados, viram seu vínculo declarado. Isso ocorre porque a lei trabalhista (CLT), em seu artigo 9º, dita: "Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação". É a regra legal de imperatividade da norma, aplicando-se o princípio da realidade da relação. Ou seja, caso se demonstre os elementos da relação de emprego ente um terceiro e o tomador de serviços, não obstante seja permitida a terceirização, a declaração de emprego será reconhecida pela Justiça do Trabalho, e disso não há dúvida.

Importante deixar claro que o trabalhador poderá continuar buscando seus direitos junto à Justiça do Trabalho, mas não há dúvida de que a regra inserida no texto da lei irá realmente precarizar o salário e outros direitos do trabalhador no seu cotidiano. Vale destacar também que, no caso de subcontratação de uma empresa de prestação por outra de prestação, responsabilizando ambas solidariamente não resolve, tendo em vista que geralmente ambas são pequenas e não conseguirão responder pelos débitos do empregado. Nessa hipótese, o empregado tentará receber de duas empresas que não terão patrimônio suficiente, o que apenas reafirma a precarização.

A regulamentação dessa forma não é o melhor caminho. Seria conveniente que se mantivesse com clareza a questão de `atividade-fim' com impedimento para terceirizar, e permissão para terceirizar a `atividade-meio'. Esse formato aprovado talvez favoreça apenas uma instituição, que pouco tem feito pelos empregados, chamada sindicato.

* Ricardo Pereira de Freitas Guimarães, doutor e mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professor de Direito e Processo do Trabalho da pós-graduação também da PUC-SP e sócio do escritório Freitas Guimarães Advogados Associados.
 



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