Licença-paternidade: é hora de repensar o papel do pai na família e na sociedade

 
Mateus Freitas*
 
Neste Dia dos Pais, mais do que celebrar laços afetivos, é preciso refletir sobre o lugar que o Brasil reserva ao pai no início da vida de seus filhos. A legislação atual é clara: a licença-paternidade no país continua entre as mais curtas do mundo, limitada a apenas cinco dias corridos, prorrogáveis para 20 dias apenas em empresas aderentes ao Programa Empresa Cidadã. Embora assegurado como um direito constitucional, o período é notoriamente insuficiente frente às demandas reais das famílias brasileiras.
 
A consequência é conhecida: a ausência forçada do pai nos primeiros dias de vida do bebê reforça a sobrecarga materna, dificulta a criação de vínculos afetivos precoces e perpetua estereótipos de gênero enraizados — como o de que cuidar de filhos é, essencialmente, tarefa da mulher.
 
Enquanto isso, países como Espanha, Portugal, França e Noruega caminham em direção oposta. Neles, a licença parental é mais longa, compartilhada de forma igualitária entre os responsáveis, com previsão legal de afastamento para o pai por períodos que variam entre 20 e até 90 dias. A lógica é simples: ao estimular a presença ativa do pai desde o nascimento, promove-se maior equidade de gênero, melhora-se a saúde mental da mãe e fortalece-se a estrutura familiar como um todo.
 
No Brasil, o Projeto de Lei 3.935/2008 tenta avançar nesse debate. A proposta amplia a licença-paternidade para 15 dias consecutivos e prevê estabilidade provisória de 30 dias ao pai após o retorno ao trabalho. Ainda que modesto diante dos padrões internacionais, o texto representa um avanço. Rompe-se, ainda que timidamente, com a visão de que a presença masculina no cuidado com os filhos é dispensável ou secundária.
 
A resistência à ampliação, por parte de setores econômicos e mesmo de algumas lideranças políticas, frequentemente repousa sobre o argumento do custo — uma visão míope que desconsidera os ganhos sociais e econômicos de longo prazo. Pesquisas indicam que a presença do pai desde os primeiros dias de vida está associada a melhores indicadores de desenvolvimento infantil, à maior estabilidade familiar e à redução de desigualdades de gênero no mercado de trabalho.
 
Garantir uma licença-paternidade mais justa é, portanto, muito mais do que uma medida trabalhista. Trata-se de uma política pública que reconhece o papel ativo do pai na criação dos filhos e valoriza o cuidado como função compartilhada. É também um instrumento poderoso para combater a naturalização da ausência paterna e reconstruir os alicerces da parentalidade no país.
 
A construção de uma sociedade mais igualitária começa por políticas que refletem a realidade das famílias contemporâneas. Se queremos um Brasil mais justo, inclusivo e equilibrado, é preciso deixar de tratar o pai como coadjuvante e garantir a ele meios reais de exercer sua paternidade de forma plena e responsável.
 
O momento de avançar é agora. O papel do Estado não pode ser o de perpetuar desigualdades, mas o de criar as condições para que mães e pais possam, juntos, cuidar, educar e amar — desde o primeiro dia.
 
*Mateus Freitas é advogado do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados
 


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