Desoneração tributária é saída para aumentar oferta de remédios gratuitos, diz CEO da ePharma

Fernando Porfírio

Democratizar o acesso da população a medicamentos é uma das grandes preocupações do médico Luiz Carlos Silveira Monteiro, CEO da ePharma, empresa focada na gestão de assistência farmacêutica, integrando benefícios e ações ligadas à saúde. Segundo o médico, chegar à terceira idade em boas condições de saúde ou conseguir tratamento para os males típicos desta fase da vida representa uma das principais preocupações de idosos do mundo inteiro. No Brasil, os idosos perdem cinco vezes mais anos de vida devido a doenças pulmonares crônicas e duas vezes mais por infarto que nos países desenvolvidos.

O governo federal tem algumas iniciativas para atender aos idosos. Como exemplos há o programa de prevenção de quedas, de distribuição de medicamentos e de fraudas geriátricas pelo poder público. Outra frente é a disponibilidade de medicamentos pela farmácia popular, por exemplo, como para doenças crônicas, como diabetes e hipertensão e fraldas geriátricas.

Luiz Carlos Silveira Monteiro diz que outro importante fator para o êxito dessas políticas é a garantia de que o paciente compre o medicamento e siga o tratamento. Segundo ele, a falta de recursos financeiros impede a continuidade da terapia e cria um círculo vicioso, que só aumenta os gastos públicos com saúde.

Um novo modelo de acesso a medicamentos vem sendo oferecido por empresas que adotam o conceito de assistência farmacêutica, providos pelas PBMs (Pharmacy Benefit Management) e vem se tornando uma solução cada vez mais adotada por órgãos públicos e empresas privadas. No país, menos de três milhões de beneficiários já têm os custos dos medicamentos cobertos pelos seus empregadores. Experiências como as apresentadas pelas companhias de PBMs podem fazer a diferença na vida de milhões de brasileiros e tornar a vida melhor para pacientes e familiares. Esse foi um dos temas tratado com o CEO da ePharma.

 

Previdência Total – O brasileiro gasta muito com medicamentos?

Luiz Carlos Monteiro – Uma pesquisa do PNAD, do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] apontou que o gasto das famílias com remédios nas farmácias é o maior do item saúde. Isso faz com que essa despesa se equipara aos custos com habitação, alimentação e transporte. Isso afeta em muito o orçamento familiar. Pesquisa da Organização Mundial da Saúde mostra que o governo cobre 47% dos gastos de cada cidadão por ano. O percentual está abaixo da média mundial que é de 56% de cobertura. Esta é uma das maiores mazelas do Brasil. E isso acontece porque o brasileiro é acomodado. Na Europa e nos Estados Unidos o gasto com medicamentos é coberto. Na Europa o pagador é o governo; nos EUA a cobertura é feita pela iniciativa privada.

 

Previdência Total – E por que não acontece o mesmo no Brasil?

Luiz Carlos Monteiro O primeiro motivo é o já citado: a falta de iniciativa da sociedade de reclamar. O segundo é a barreira tributária. A primeira barreira pode ser ultrapassada pelos sindicatos e associações de classe. Elas têm um papel fundamental nessa luta para popularizar o acesso gratuito a medicamento. Hoje temos apenas 3 milhões de brasileiros com acesso a esse direito e, no caso, teve a participação dos sindicatos que souberam pedir.

 

Previdência Total – Mas como os aposentados podem ter acesso a esse direito, uma vez que os sindicatos, principal instrumento de pressão, não estão tão envolvidos com esse setor?

Luiz Carlos Monteiro – No campo do usuário não registrado, como é o caso dos aposentados, embora existam sindicatos e associações, o caminho é o governo. O Estado brasileiro é o maior pagador de medicamentos, mas essa política ainda representa um grão de areia. O programa Farmácia Popular é uma grande parceria que integra a política pública de saúde. O projeto foi criado para ampliar o acesso dos brasileiros a medicamentos essenciais, como analgésicos, antihipertensivos e remédios de controle para diabetes, colesterol, entre outros. Nesse caso, os medicamentos são comprados de laboratórios farmacêuticos oficiais públicos ou privados. Quando necessário, são adquiridos por meio de pregões. Em 2006, o programa foi estendido para a rede privada de farmácias, com a criação do Aqui tem Farmácia Popular. O beneficiado pode comprar três tipos de medicamentos – para diabetes, hipertensão e anticoncepcionais – em farmácias conveniadas ao governo, pagando até 10% do valor do produto. O restante do valor fica a cargo do governo. Hoje são atendidos 2,9 milhões de pessoas.

 

Previdência Total – O país tem um gasto e tanto?

Luiz Carlos Monteiro – Sim. É mais isso. É um sinal de alerta, principalmente para um país que, a cada ano, vê aumentar a expectativa de vida de sua população. Em poucas décadas teremos uma população de idosos maior que a de jovens. Esses gastos terão impacto relevante e afetará diretamente o custo de toda a assistência pública de saúde.

 

Previdência Total - E esse formato de financiamento público atende à proposta de entregar remédio gratuito par aos mais pobres?

Luiz Carlos Monteiro – É importante frisar que o financiamento público da assistência farmacêutica possibilita o acesso a medicamentos a uma parcela importante da população brasileira. Além disso, existem evidências da sua natureza progressiva, uma vez que é a população de menor renda que faz mais uso do fornecimento público de medicamentos. Por outro lado, as famílias mais ricas gastam mais com a aquisição privada de medicamentos do que as mais pobres. Entretanto, exatamente as famílias mais pobres, que gastam muito menos com medicamentos que as famílias mais abastadas, em termos absolutos, são aquelas que proporcionalmente comprometem muito mais a renda familiar na aquisição com esses bens essencial.

 

Previdência Total – O senhor falou da primeira barreira ao acesso gratuito, que seria a falta de mobilização da sociedade. E quanto ao segundo?

Luiz Carlos Monteiro É a desoneração tributária para o setor. Só para se ter uma ideia: numa receita de R$ 80,00 quase R$ 50,00 corresponde a tributos. O medicamento é caro porque o governo cobra muito imposto em cima do produto. Ou seja, enquanto o Estado tenta, por um lado, fornecer medicamento gratuito, de outro lado tira o medicamento do acesso da população por meio de uma tributação que a 34% para remédios comprados nas farmácias, segundo um levantamento da Interfarma [Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa]. A realidade é outra em países como Canadá, Estados Unidos e Reino Unido, que têm tributação zero. Outros, como Holanda, Bélgica, Suíça, França, Itália e Portugal cobram, no máximo, 10%.

 

Previdência Total – E esse custo, acentuado pela tributação, interfere no tratamento médico?

Luiz Carlos Monteiro – Um levantamento feito pela ePharma, por exemplo, mostra que apenas uma pequena parte dos pacientes com altas taxas de colesterol tomam medicamentos regularmente. O trabalho acrescenta que, no Brasil, o custo médio anual do tratamento da doença gira em torno de R$ 1.800,00. Um gasto que faz muitos pacientes desistirem do tratamento, principalmente por ser uma doença silenciosa e que, inicialmente, não apresenta sintomas visíveis.

 

Previdência Total - Que outros caminhos poderiam ser adotados além da desoneração?

Luiz Carlos Monteiro – Uma iniciativa é o chamado PBM (Programa de Benefício em Medicamentos) que vem sendo adotados por várias empresas brasileiras. O programa oferece aos funcionários subsídios de até 100% para a compra de medicamentos por meio de uma rede de farmácias credenciadas. Em outros casos subsidiam de 50% a 80% nos preços de remédios para doenças crônicas e um percentual menor para as doenças mais graves. No país, o programa atende mais de 2 milhões de brasileiros.

 

Previdência Total – A Resolução 310 da ANS também é mais um passo para baratear os medicamentos?

Luiz Carlos Monteiro Sim. A medida rompe com o círculo vicioso do paciente que vai às consultas, mas não continua o tratamento pelo alto custo dos remédios. Ao permitir que os planos de saúde ofereçam remédios de uso domiciliar para patologias crônicas, a Resolução Normativa cumpre esse papel. A norma ainda pode incentivar a produção de genéricos que hoje representa apenas 27,3% do mercado, enquanto nos Estados Unidos esse setor responde por 70% das vendas.



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